segunda-feira, 13 de janeiro de 2014

Anarcomachismo: a luta contra o Capitalismo e contra o Estado, porém de braços dados com o Patriarcado.





Lutar contra o capitalismo será suficiente para se acabar com todas as opressões existentes?

O patriarcado é um sistema que compactua com outras estruturas hierarquizantes e geradoras de opressão, injustiça e valores diferenciados. Desde o advento da propriedade privada, com o surgimento do capitalismo, o patriarcado vem se fortalecendo com base em inúmeros motivos que se pautam desde à religião, até à lógica biologista que analisa os funcionamentos dos corpos e nos encarcera, com o aval científico, em papeis muito mais antigos que a própria ciência.
Entretanto, embora seja visivelmente fortalecido pelos demais sistemas opressores que se estruturam na sociedade capitalista ocidental, o Patriarcado mostra-se cada vez mais  um sistema de complexidades e peculiaridades distintas. Sendo, por isso, não só mera consequência do capitalismo, mas um sistema que garantiu sua autonomia e que pode ser perpetuado também em outras organizações sociais. 
Breve delineação histórica do patriarcado e do capitalismo.
O mercado faz uma profunda inversão de valores a partir do momento que evidencia o capital e exige do ser humano maior dedicação à produção de mercadorias, relegando ao campo privado e particular, características desmoralizantes por não contribuir com o crescimento econômico da nação.
Assim, por conta suas características físicas, a mulher fica encarcerada unicamente no campo particular, do cuidado da casa e dos filhos, e os saberes ali desenvolvidos, saberes muito próximos da natureza, do cuidado das ervas entre outras coisas, são renegados, desvalorizados e subjulgados[1].
Entretanto, com a revolução industrial no século XIX, a Europa protagoniza o crescimento abrupto de uma classe social potencialmente revolucionária, o proletariado, onde se encontravam não somente homens, mas mulheres e crianças. Todxs trabalhando em situações análogas à escravidão, porém, com maior desvalorização econômica de crianças e mulheres, as quais trabalhavam em jornadas tão exaustivas quanto os homens, mas ganhavam muito menos que eles.
Andrea Nye, no livro, Teoria feminista e as filosofias dos homens, faz uma análise dos principais acontecimentos históricos da humanidade, bem como sobre o surgimento das principais correntes filosóficas que tentavam dar novo sentido e novo rumo à história da sociedade, evidenciando os movimentos de mulheres que sempre tentaram, de alguma maneira, fazer com que a revolução fosse também um assunto feminino.
Dentro dessa perspectiva, Nye traz à tona as discussões que foram empreendidas no século XIX sobre a participação feminina no mercado de trabalho, de forma que as mulheres pudessem então contribuir com a economia e com a política do país, saindo do subjulgamento de seus maridos. A proposta, entretanto, só parecia inovadora para as mulheres da classe burguesa, que ainda empreendiam somente o papel de donas de casa e de mães, pois as mulheres das classes baixas já participavam do mercado de trabalho, afinal, a revolução industrial introduziu as máquinas na produção de mercadorias, fazendo com que as mesmas substituíssem a força física pelo puro uso da técnica[2]. Assim, mulheres e homens poderiam integrar com igualdade as mesmas tarefas no cenário industrial.
Entretanto, não havendo um debate aprofundado sobre os papeis de gênero, a mulher que entrou no mercado de trabalho, continuou sendo refutada para os papeis domésticos (fazendo com que a dupla jornada de trabalho fosse quase compulsória), sendo limitada em estereótipos que também colocavam em cheque sua capacidade nas indústrias, fazendo com que as mesmas não fossem reconhecidas e nem respeitadas no papel que desempenhavam como trabalhadoras no mercado industrial.
Movimentos de esquerda e machismo ao longo da história.
Mesmo em meios revolucionários, onde se objetivava a superação de modelos econômicos geradores de hierarquias opressoras e infundadas, o pensamento machista continuava a repercutir, limitando e ridicularizando os variados movimentos de mulheres que surgiram ao longo da história.
Karl Marx, no consagrado Manifesto do Partido Comunista, pretendendo acabar com a propriedade privada, bem como substituir a imagem da tradicional família burguesa, esboça um modelo de relações livres e diz que as mulheres passariam a ser socializadas ou, para ficar mais claro, compartilhadas. Dessa maneira fica explícita a forma como gênero feminino é objetificado e tratado como propriedade.
Há uma profunda contradição entre os movimentos revolucionários no que tange a questão de gênero. Os homens, estando em uma posição de vantagem e superioridade garantida historicamente pelo Patriarcado, eram os únicos a receberem educação acadêmica, e por isso, os primeiros a formularem alternativas de organizações sociais. Por esse motivo, ficava claro que, estando em posição de vantagem, ficava difícil que os mesmos questionassem os papeis compulsórios de gêneros e a opressão sob as mulheres nos novos modelos de sociedade. Mesmo se empenhando na formulação de sistemas menos opressores, o machismo não era visto como um problema, ou como uma forma de opressão, e ao contrário, era até mesmo mantido por meio de falas que retificavam os papeis limitados destinados às mulheres.
Apenas alguns homens e alguns movimentos se empenharam na luta pela igualdade entre homens e mulheres, entretanto, sendo considerada uma pauta secundária, nunca foi plenamente tratada dentro de sua complexidade. Mulheres dentro dos movimentos de esquerda eram limitadas a simplesmente endossarem a opinião de seus maridos. E quando as mesmas tentavam expressar sua autonomia, a maneira que encontravam para protestarem (muitas vezes através de panelaços) era considerada histérica e ridícula para os moldes da “política séria” e burocrática organizada pelos homens.
Movimentos anarquistas atuais e a reproduções de opressões machistas.
Somando todos os motivos já citados que fizeram com que muitos movimentos de esquerda negligenciassem as pautas de gênero, sendo até muitas vezes promotores da ordem machista do patriarcado, podemos colocar o anarquismo como outro movimento que cai constantemente em tal contradição.
Entretanto, é válido ressaltar: Não é pauta dos movimentos de esquerda levar as opressões do Patriarcado para outras organizações sociais. Há inclusive um estudo sobre a igualdade de gênero como uma proposta que surgiu no meio anarquista, comentada pelos principais teóricos do movimento: Bakunin, Malatesta e outros. A autora do referido artigo diz: 
“Para Bakunin o casamento civil e religioso, típico da sociedade burguesa, era duplamente negativo. Primeiro porque, na qualidade de um contrato civil, regulamentava e disciplinava a família, circunscrevendo o espaço da sexualidade, prescrevendo a submissão da esposa ao marido e delimitando os papéis sociais/sexuais do casal. Segundo porque, na condição de um contrato econômico, normalmente endógeno, preservava e ampliava a riqueza de um determinado segmento social, mantendo, assim, a dominação de classe” (MARTINS, Angela, p. 2).
Como podemos ver, o machismo encontrado nos movimentos sociais de esquerda é encontrado não por ser levado como pauta, mas simplesmente por uma displicência de tais organizações esquerdistas na completa desconstrução dos preconceitos do sistema Patriarcal. Nos meios intelectuais, a opressão de gênero é abordada como uma consequência de um sistema maior de opressões, quando na verdade, o Patriarcado paira sobre a sociedade com uma autonomia e independência impressionantes. Portanto, não é suficiente tocar de leve as questões de gênero, como faz o anarquismo. É preciso de uma profunda desconstrução, bem como de todo um esforço voltado para aniquilar o patriarcado, tratando-o como um problema de complexidade e autonomia próprias, e que não podem ser relevadas ou deixadas como luta de segunda ordem, sob nenhuma hipótese.
Assim, como consequência dessa crítica rasa ao machismo, é possível encontrar hoje em dia diversos Coletivos que se organizam segundo a filosofia libertária, e que infelizmente ainda traz muito explicitamente absurdos comportamentos machistas da estrutura patriarcal. Várias páginas feministas denunciam constantemente abusos e violências cometidas dentro de meios anarquistas. Os mesmos meios e movimentos que lutam contra a opressão da classe trabalhadora, do outro lado, ajudam a perpetuar pensamentos e atitudes preconceituosas com as mulheres. Como exemplo dessas constantes contradições podemos trazer algumas músicas:

Mulher Enrustida
Os Replicantes

Mulher Enrustida
Não adianta só ficar me encarando
Não adianta só ficar se mostrando
Eu já cansei de ficar só te secando
Eu quero mais é que você vá chupando
Eu to de saco cheio de mulher enrustida
Eu quero ser levado e servir de comida
Eu to de saco cheio de mulher enrustida
Ao menos seja boa e vá pagando a bebida
Mas se você continuar se amarrando
Não pense que é tão fácil, eu já vou avisando
Tá chegando agora uma gata brilhando
Eu acho que você não tá mais agradando
Eu to de saco cheio de mulher enrustida
Eu quero ser levado e servir de comida
Eu to de saco cheio de mulher enrustida
Ao menos seja boa e vá pagando a bebida

Mulheres II
DFC

Mulher tem que apanhar
Mulher tem que cozinhar
Mulher tem que calar
Mulher tem que lavar
Mulher tem que passar
Mulher tem que me dar
Mulher tem que costurar
Mulher tem que encerar
Mulher tem que chupar
Tem que sofrer
Tem que fuder
Tem que mexer
Tem que gemer
Tem que me dar
Tem que apanhar
Tem que calar
Tem que chupar
Sem reclamar!

O Dotadão Deve Morrer
Ratos de Porão

O dotadão arrastou
Todas as garotas
Para a casa dele
O dotadão arrastou
Todas as garotas
Para fora do bar
Hey rapazes
Esse cara deve morrer
Deve morrer
Deve morrer
Deve morrer
O dotadão arrastou
Todas as garotas
Para o carro dele
O dotadão arrastou
Todas as garotas
Para fora do bar
Hey rapazes
Esse cara deve morrer
Deve morrer
Deve morrer
Deve morrer
Todo mundo enlouquece
Sem mulher
Todo mundo enlouquece
Sem mulher

Fernandinho Viadinho
Garotos Podres

Quando ele era pequeno,
Era o maior bicha
Do colégio interno,
Mas quando ele cresceu
Resolveu tomar a linha!
Aprendendo karatê,
Pra bater nas menininhas!
Fernandinho Viadinho!
Das festas de embalo
Do baixo Leblon
As orgias em Brasília
Agora só passa a mão
Na poupança das velhinhas!

As músicas demonstram o perigo de um meio pretensamente revolucionário que, entretanto, não assume a desconstrução patriarcal. Muitas dessas letras acabam parecendo até uma conversa entre colegas, onde os integrantes assumem suas preferências, fazem suas ‘brincadeiras’ sobre o sexo oposto, e reproduzem opressões e preconceitos como se fossem inofensivos.
Essas características revelam outro problema: a ausência da voz feminina como força autônoma e ativa na construção de outro modelo de organização social. A ausência dessa voz permite que o lugar de privilégio dos homens seja assegurado, uma vez que homens acomodados com os confortos garantidos pelo patriarcado se tornam os próprios defensores de tal sistema, obviamente.

Reivindicar, resistir, constuir.

A resposta do movimento feminista deve vir de encontro com as incoerências ideológicas de tais movimentos ditos combativos, anticapitalistas e anti-imperialistas, apontando para a falha de se construir movimentos de esquerda que não tangem as questões de gênero, ou que as colocam como secundárias. Essa resposta, entretanto, deve-se dar para além do confronto intelectual ou ideológico. Devemos  ocupar a esquerda com a nossa voz, não apenas esperando um espaço para as nossas pautas, mas colocando-as como parte integrante de todo o processo de questionamento das bases opressoras. Devemos nos confrontar a ponto de combater nossas inseguranças, para que possamos com mais força nos posicionarmos diante de argumentos equivocados nos movimentos de esquerda que apontem para o mais sutil desleixo com as questões de gênero, ou que mostrem mesmo o mínimo pensamento machista e patriarcal. Por fim, devemos nos conscientizar que ou a libertação se dará por completo, entre gênero, classe e cor, ou não haverá revolução de fato.



[1] Rosiska Darcy de Oliveira, em Elogio da Diferença, faz uma interessante análise sobre a desvalorização do feminino como campo que não contribuía com as características do campo público, destinado ao masculino e às negociações políticas e econômicas.

[2] Simone de Beauvoir, no seu aclamado livro Segundo Sexo, faz uma análise minuciosa sobre a situação da mulher, passando desde os tempos pré-históricos, até a sociedade moderna. Assim, Beauvoir analisa a opressão feminina mantida por conta de seu papel desempenhado na reprodução, o qual era relacionado mais à repetição da vida do que à superação da vida.

terça-feira, 7 de janeiro de 2014

Aborto :um assunto urgente.


Foto de Rodrigo Bixo Urbano-

Protesto realizado pelo Coletivo

Feminista Baré, 8 de março de 2013
Aborto é o tema que é tratado no campo da moralidade, jamais político. Quando por muito esforço de mulheres feministas, o assunto adentra os movimentos sociais libertários como pauta, ainda assim é colocado em posição secundária. Dessa forma, enquanto o tema é evitado ou não é colocado como prioridade, mulheres (feministas ou não) morrem. 

O debate moralista sobre o aborto inicia-se no questionamento de onde começa a vida do “feto” e quando o mesmo pode ser considerado ser humano. Na opinião dos religiosos, a vida começa no mesmo momento em que o espermatozoide se une ao óvulo formando o zigoto. Portanto, na opinião desse grupo, interromper essa gestação será consequentemente um assassinato cometido pela mulher que não deseja parir nesse momento.

Assim, o direito tido como inalienável à mulher é renegado (o de legislar sobre o próprio corpo), salvo sobre casos comprovados de riscos a vida da mulher e em gravidez decorrente de estupro. E nesses casos depende muito da cor da sua pele e de sua conta bancária, assim terá direito a um bom advogado (homem), convenhamos, inocência de quem pensa isso. Pra quê recorrer para um advogado se você não depende da saúda pública e pode muito bem fazer seu aborto numa clínica (com a sensação de ser mais seguro).

Quem precisa de assistência médica pública, somos nós mulheres pobres.

 

Falo isso pois creio que os danos morais e físicos para uma mulher, assim como eu que sou pobre, são bem maiores do que aquela que dispõe de recurso para amenizar ou mesmo invisibilizar a prática de abortamento. Evidente, que independente da classe social que esteja se somos mulheres somos colocadas no local da subalternidade. Acredito sim que os impactos da mulher burguesa ao abortar são os mesmos, as dores e entraves morais que serão enfrentados também, o que difere são os recursos que cada uma vai ter ou não.
Entendo como prioridade lutar pela vida, por nossas vidas. Se homem engravidasse, o aborto seria legal e seguro, quem sabe até protegido por “licença abortamento” para dar uma pausa no trabalho e poder se cuidar. Afinal, a pedra fundamental de um sistema-patriarcal- não pode ser abalado por moralismo religioso de ninguém.
Voltando a realidade companheiras, devemos ter em mente que temos que ser radicais, temos que ir na raiz dos nossos problemas.
Para nós feministas, e para alguns simpatizantes referente as nossas causas femininas, a igreja católica simboliza a base do pensamento conservador que assassina mulheres  para salvar os que ainda nem são. É importante salientar que a igreja católica simboliza, mas não monopoliza o debate anti-aborto.
A resistência tradicional das Católicas pelo direito de decidir é parte pequeníssima no pensamento majoritário católico que utopicamente fala de relação sexual para procriação, o que jamais ocorreu na história da humanidade é incentivado dentro das igrejas e recai somente sobre  nós mulheres: a responsabilidade de “se preservar” dos prazeres sexuais, assim,  quando não  fazemos as consequências são somente nossas. O aborto para muitas não é sequer pensado ou discutido, já que muitos o enxergam como quebra de dogmas, a vida da mulher não faz parte do princípios de fé, a religião atua como  legitimador das leis e o estado trata de ampará-la com instituições carregadas de tudo menos de laicidade.
O ápice do abuso estatal sobre nossas vidas é o Estatuto Nascituro, prova de que somos vistas como um aparelho reprodutor as fêmeas para procriar.
Legalizar o aborto é prioridade e urgência!
Companheiras não aceitaremos de modo passivo nenhum abuso sobre os nossos direitos. Vamos lutar de modo combativo por mais direitos para que possamos unidas, derrubar o patriarcado. Elencamos alguns motivos pelo qual somos contra o Estatuto Nascituro:

1- Se você ou uma mulher for ESTUPRADA e engravidar a gravidez não poderá ser interrompida;
2- O estuprador, se identificado, deverá registrar a criança e será reconhecido como pai da criança. Ele deverá pagar pensão alimentícia até os 18 anos, assim tendo acesso à vítima e à família dela;
3- Caso o Estuprador não seja identificado, o Estado se responsabilizará pela criança. Ou seja, o estatuto reduz a mulher à condições de reprodutora e mais uma vez desconhece a mulher como ser humano, não importando as consequências que venha a ter por uma gestação indesejada;
4- Caso a mulher cogite fazer um aborto, será considerada criminosa. Caso tenha aborto espontâneo será investigada para provar que não o provocou.
5- Atualmente, abortos de fetos sem chances de sobreviver, são permitidos. Se aprovado, o Estatuto não permitirá mais que isso aconteça, submetendo a mulher a todo tipo de mal-estar causado pela gestação;
6- Todas as pesquisas com células-tronco que podem salvar milhões de visa serão imediatamente interrompidas;
7- Ele atinge valores construídos através da luta legítima de mulheres e golpeia a liberdade individual;
8- O estatuto dá nitidamente, prioridade para o embrião, mesmo que fora do útero em detrimento da mulher, ainda que o estado não perceba trata-te de um ser humano;
9- O estupro não será mais visto como violência;
10- O estuprador pode vir a se tornar uma figura permanente na vida da mulher e de seu filho, obrigando a vítima a conviver direta ou indiretamente com ele. Querem compensar o abuso sexual com migalhas, com dinheiro. Nada silenciará nossa voz.
       



 Deixamos como dica para continuar a reflexão o documentário Fim do silêncio sobre aborto:

segunda-feira, 6 de janeiro de 2014

“A mulherada já sabe o cotidiano da rua, anoiteceu sozinha você não tá segura!”

“A mulherada já sabe o cotidiano da rua, anoiteceu sozinha você não tá segura!”


Para começar em falar de Estupro vamos reforçar algumas coisas, estupro não é sexo, é dominação e violência! Apenas no século XVI passa a ser tratado como crime sexual e ainda assim estritamente encarado como um roubo da pureza e castidade feminina. Os dados brutos sobre esse tema aqui no Brasil são confusos e ficam aquém da realidade segundo levantamento feito pela ONU cerca de 70% das mulheres sofrem algum tipo de violência no decorrer de sua vida. As mulheres de 15 a 44 anos correm mais risco de sofrer estupro e violência doméstica do que câncer, acidentes de carro, guerra e malária.  O estupro assim com toda violência sofrida pela mulher é tido como um assunto privado, despolitizando e retirando-o com um problema da sociedade em geral e também de saúde. Reforçam constantemente o silêncio das mulheres, afinal falar sobre abuso sexual é viver novamente o abuso, no intuito tardio de “preservar” as pessoas que foram abusadas é comum ouvir a frase: é melhor esquecer isso. Melhor pra quem?  Melhor seria não passar por isso! Os valores morais do século XVI são presentes em 2014, são base de todo esse pensamento pró-vida, pró-família, falar sobre o abuso sexual, segundo eles é constrangedor  para a família da vítima e então é melhor calar-se,já  em um julgamento onde o homem é acusado de abuso a vítima tem que falar perante várias pessoas, tem que lembrar de detalhes, tem que ser clara passar ser testemunha, tem que alienar-se do que aconteceu(já que é VITÍMA).

Isso pode parecer confuso de ler, mas é assim: Juízes, como era de se esperar, questionam sobre a vida sexual da mulher que foi abusada, se era virgem, se estava sobre efeito de algum tipo de remédio, álcool ou drogas.


Na Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra a Mulher – Convenção de Belém do Pará/ONU teve como pauta principal dispensar atenção à violência sexual e doméstica bem como ações de ampliação e na qual estão previstas ações de ampliação e acessibilidade das mulheres e adolescentes aos serviços de saúde.Na cartilha elaborada pelo ministério da saúde tratamento dos agravos resultantes da violência sexual contra mulheres e adolescentes destaca-se:
“O atendimento aos casos de violência sexual requer a sensibilização de todos os funcionários do serviço de saúde,propõe-se a realização de atividades que favoreçam a reflexão coletiva sobre o problema da violência sexual, sobre as dificuldades que crianças, adolescentes e mulheres enfrentam para denunciar esse tipo de crime, os direitos assegurados pelas leis brasileiras e o papel do setor saúde, em sua condição de co-responsável na garantia desses direitos”


O acolhimento aqui no Amazonas, precisamente em Manaus para as vítimas de abuso sexual são muito cruéis, @s profissionais de saúde não contam com um pingo de humanidade descumprindo tudo que fora acordado e como é de costume reforçando o papel desse estado fascista e desumano, que trata toda mulher com mais um número de uma tabela mal feita.

Segundo o pesquisador Natã Souza, que desenvolve investigação sobre a temática do abuso sexual infantil com enfoque nos abusadores, constatou:

“um nojo d@s profissionais de saúde, até mesmo de alguns psicólogos [...] além da recorrente culpabilização no caso da vítima em questão, a criança”


Existe um consenso sobre estupro: Um homem que estupra uma criancinha é um monstro! No entanto esse monstro transforma-se em homem que segue seus instintos a partir do momento que, conforme esse pacto imundo, o corpo não é mais um corpo e sim um lugar fetichizado, daí por diante ocorre a metamorfose doentia que transforma a vítima em provocadora (Ela criança mas tem corpo de mulher; ela sempre fica muito bêbada e não lembra de nada, vai ver foi isso de novo; você já viu as roupinhas dela, acho que piriguete não sente mesmo frio; Ela é a empregada da casa dele, isso sempre acontece, ela bem que gostou; Feia daquele jeito, deveria agradecer)  e o monstro em um homem que segue seus instintos. (Mas essas meninas provocam os homens, é isso que dar)


A cada três minutos uma mulher é violentada no Brasil.
A cada 2 horas uma mulher é assassinada no Brasil.

Além desses dados alarmantes o estado brasileiro machista como é ignora e anula o ato de que mulheres morrem todo dia! Reforço aqui o que já foi dito em postagens anteriores: O Femicídio é real. As sequelas físicas e psicológicas que um abuso sexual pode deixar são enormes, além de ter que enfrentar e combater o machismo, nós somos expostas e colocadas nas mãos de médic@s insensíveis que se valem da profissão para mais uma vez constranger quem necessita de cuidados especiais: a vítima.

A “cultura do estupro” nada mais é que um ambiente favorável para a coisificação do corpo feminino e da sexualidade, desta maneira entende-se que certos comportamentos são aceitáveis, o homem usar o corpo da mulher sem seu consentimento, ou por meio de coerção. Isso ainda assim parece muito afastado do cotidiano, achar que alguém no mundo acha normal abusar de uma mulher, mas você reproduz isso quando diz que nós mulheres devemos preferencialmente evitar alguns comportamentos, algumas roupas, sair durante certos horários. Quando se faz isso está ratificando essa cultura de que é comum sim estuprar, além de cercear a liberdade individual de cada uma de nós.